Debatedores apontam casos de racismo e xenofobia no Brasil

Lucio Bernardo Jr. / Câmara dos Deputados
Audiência pública sobre os recentes casos de ataques xenófobos no Brasil, em especial contra os imigrantes haitianos
Dados do Ministério da Justiça apontam que o número de imigrantes que solicitam o visto de permanência no Brasil dobrou em quatro anos, chegando a 30 mil pedidos anuais – contra 15 mil em 2010. Do Haiti, chegaram ao Brasil mais de 7 mil pessoas apenas pelo Acre
A Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional promoveu audiência pública para discutir recentes casos de ataques xenófobos no Brasil, em especial contra os imigrantes haitianos. A audiência foi pedida pelos deputados Ivan Valente (PSOL-SP) e Jean Wyllys (Psol-RJ). A motivação para a audiência foi um ataque contra refugiados haitianos, ocorrido em 1º de agosto, em São Paulo (SP).
Na ocasião, seis pessoas foram atingidas por balas de chumbinho nas escadarias da Igreja Nossa Senhora da Paz, onde funciona a Missão Paz, que acolhe imigrantes em São Paulo. Segundo os deputados, antes de receberem atendimento médico, os haitianos foram rejeitados em duas unidades de saúde.
Dados do Ministério da Justiça apontam que o número de imigrantes que solicitam o visto de permanência no Brasil dobrou em quatro anos, chegando a 30 mil pedidos anuais – contra 15 mil em 2010. Do Haiti, chegaram ao Brasil mais de 7 mil pessoas apenas pelo Acre.
Crise econômica
A crise econômica foi apontada como ingrediente novo nas manifestações contra estrangeiros, especialmente haitianos e africanos. “O imigrante pode parecer para alguns como concorrente, mas um país com 200 milhões de habitantes não pode ficar preocupado com 10 mil imigrantes. Isso não influi em nada na questão da mão de obra. É produto de um preconceito”, disse Ivan Valente.
Eliza Odina Conceição Silva Donda, representante do Projeto Missão Paz, relatou como foi o caso da agressão aos haitianos. A entidade é referência em serviços de assistência a imigrantes e refugiados e recebeu 5 mil deles somente em 2014. Eliza admitiu a existência de racismo e xenofobia contra imigrantes, mas disse que nesse caso específico isso ainda não está comprovado.
“Eles não ouviram nenhum grito contra o fato de eles estarem no Brasil. Eles acharam que tinham sido apedrejados. Eles estão com medo”, explicou. Segundo ela, a agressão pode ter sido uma retaliação de gangues de assaltantes que age na região que responsabiliza os haitianos pelo aumento de policiamento no local.
De acordo com Eliza, a xenofobia ou racismo nascem da falta de informação. “O imigrante ainda é visto como uma ameaça, um criminoso. Não pode haver essa generalização”, disse.
A audiência também contou com a presença de Juliana Felicidade Armede, da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo. Ela admitiu outras ocorrências contra imigrantes em São Paulo, em especial na região de Americana (SP).
Intolerâncias
A pastora Romi Márcia Bencke, representante do Conselho Mundial de Igrejas Cristãs no Brasil, disse que casos como o dos haitianos não são isolados. “Xenofobia é relacionada a outras intolerâncias, como religiosa, de gênero, linchamentos públicos e aumento da violência policial”, disse.
Segundo ela, no caso de haitianos e senegaleses, a xenofobia tem relação com o racismo, que é ainda bastante forte no País. “Houve o caso de um senegalês queimado no Rio Grande do Sul, e é comum haitianos e senegaleses serem abordados por policiais”, disse.
Ela apresentou dados da Pesquisa Mundial de Valores, realizada no Brasil em 2014, segundo a qual 74% dos entrevistados disseram que as ofertas de empregos deveriam ser feitas prioritariamente a brasileiros, e não a estrangeiros.
Estereótipos
Magali Naves, representante da Secretaria de Igualdade Racial da Presidência da República, admitiu o preconceito contra estrangeiros no País, especialmente contra os negros. E contou que participou, como representante do governo, do lançamento de um programa educacional voltado para estrangeiros “em um estado do sul”, programa planejado com base em hipóteses equivocadas. “Era um programa de alfabetização de haitianos. O problema é que a maioria dos imigrantes do Haiti tem ensino médio e muitos têm curso superior ou doutorado”, disse.
Renel Simon é estudante de Relações Internacionais e veio do Haiti há três anos. Ele trabalha no Centro de Referência e Assistência Social do Vale do Taquari (RS) como apoio a imigrantes, não só haitianos. “O pessoal só fala dos haitianos, mas tem também os senegaleses, afegãos e outros”, disse. Ele apontou casos de racismo e xenofobia no Brasil “É importante ouvir o imigrante para saber o que estamos passando. Eu, como imigrante, já acompanhei vários casos de racismo e xenofobia. Mês passado um haitiano levou um tapa na cara porque chegou cinco minutos atrasado no trabalho”, disse.
Inserção na sociedade
O deputado Takayama (PSC-PR), descendente de japoneses, participou da discussão. “Meus pais vieram para o Brasil nas mesmas situações que os haitianos enfrentam hoje. E ninguém pode dizer que os japoneses não contribuíram com o Brasil”, disse.
Para o deputado Henrique Fontana (PT-RS), o Brasil tem que criar condições para que os imigrantes sejam inseridos na sociedade. “Temos que abrigar imigrantes no Brasil e mudar as restrições que ocorrem em outros países”, disse.

Reportagem - Antonio Vital
Edição - Newton Araújo

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