Carnaval como antigamente está de volta
A
parceria do poder público com as associações de moradores de Rio Branco
resgata a ligação perdida entre o Carnaval de rua e as comunidades.
Agora, mais de 30 bairros fazem parte da agenda da folia, que iniciou na
última sexta-feira, 6, e se encerra no dia 17 deste mês.
A mudança começou gradativamente. A
partir de 2013, a cheia do Rio Acre colocou a diversão do povo em
debate. Após rever quais decisões eram prioritárias, governo e
prefeitura decidiram que estava na hora de mudar a forma de execução da
maior festa popular da Capital.
A proposta era de incentivar os
moradores para que assumissem a produção das próprias comemorações. Algo
semelhante já ocorria desde 1978, na Base. É o caso do bloco Sambase,
que, além da folia comunitária, também é famoso pela apoteótica queima
de fogos na virada de ano.
Exemplos de organização como essa
puderam moldar que tipo de guinada se fazia urgente para que as ações da
última década não fossem abandonadas. E deu certo. No primeiro ano,
apenas sete bairros aderiram, mas em 2014 foram 17.
Era o sinal que faltava para que a
gestão permanente fosse devolvida à comunidade, assim como havia
começado. A ideia está apoiada num conceito defendido pelo governo
federal: a administração pública não faz cultura, mas, sim, o povo.
Sobre segurança, o diretor-presidente
da Fundação Garibaldi Brasil, Rodrigo Forneck, garante que o número de
ocorrências deve se manter reduzido. “Isso ocorre graças a facilidade de
acesso dos moradores. Os foliões são conhecidos da comunidade e o uso
de veículos é bem menor”.
Para 2015, a programação ainda
contempla o Concurso de Blocos com Bateria, que já está na quarta
edição, e a escolha democrática das realezas – Momo e rainhas do sexo
feminino, gay e travesti. Abaixo, você confere um breve panorama
histórico de como eram as festas de Carnaval na cidade.
Do início à decadência
No século passado, entre os anos 20 e
30, os carnavais eram marcados pelas batalhas de confete e serpentina na
praça do Palácio Rio Branco. A rivalidade entre os clubes Rio Branco e
Tentamen se evidencia na década de 1940, com reflexos da disputa entre
os dois lados da cidade.
Os blocos de rua só ganham força e
evoluem para a posição de escolas de samba nos idos de 1960. Nesse
período, inclusive, havia até mesmo cobrança de ingresso para assistir
aos desfiles na Avenida Getúlio Vargas. Mas, a partir de 1980, começa a
fase de decadência.
"O trabalho de resgate do carnaval de
rua é um trabalho recente. Na última década, esse incentivo tem sido
ainda mais forte com os bailes da Tentamen e o carnaval da Gameleira,
cujo tema remetia ao Carnaval de antigamente", comenta o historiador
Marcos Vinícius Neves.
Pormenores
A banda da Guarda Territorial do
Estado reproduzia as marchinhas aos brincantes da época. Era dia e noite
acompanhando a multidão, em todos os cantos da cidade. O carnaval de
rua não era tão forte, mas não faltavam os “Blocos de Sujos”, que saiam
aos domingos e terças-feiras da folia.
Aliás, cada distrito tinha os próprios
representantes que disputavam pelas fantasias mais bonitas e pelos
blocos mais animados. Nada diferente dos clubes da elite. As vestes eram
elaboradas no mais absoluto sigilo para que os rivais não tivessem
conhecimento do tema e muito menos dos detalhes.
Era algo tão bonito que as pessoas iam
à porta apenas para olhar os foliões, a chamada “Turma do Sereno”. Na
última noite, a banda que tocava na Tentamen ganhava as ruas em direção
ao Rio Acre, onde ocorria a despedida do Carnaval nos navios João
Gonçalves e Benjamim.
A origem do Rei Momo
O primeiro título criado foi o de Rei
Momo, na década de 1950. Luiz Lima dos Santos deteve o cetro, manto e
coroa por mais de 15 anos. Não foi eleito, mas escolhido. E todos os
anos os clubes o procuravam.
Ao contrário de Sua Majestade Luizão,
falecido em 1985, a viúva Naila José dos Santos conta que nunca gostou
da festa. Entrevistada pela Agência de Notícias do Acre, em 2009, ela
disse que esperava o marido terminar de se arrumar para fazer o que fez
durante as noites de carnaval: dormir.
"O pessoal vinha trazer a roupa,
maquiava, ajudava a arrumá-lo e o levavam para os clubes. Eu nunca
impedi que ele fosse porque eu não queria ir. Se gostava, tinha que
brincar. Ele era a animação em pessoa, adorava o Carnaval".
Após a morte, Luizão foi tema de
enredo da também saudosa Escola de Samba Unidos do Bairro 15 (Esub). De
origem paraibana, veio ao Acre fugindo das dificuldades do Nordeste.
Aqui, cortou seringa e, depois, quando migrou para a Capital, tornou-se
comerciante.
A primeira das rainhas
Nada de esplendor ou pouca roupa. A
rainha vestia a mesma fantasia do bloco do qual fazia parte e só sabia
que havia sido eleita quando recebia coroa e faixa para desfilar pelo
salão. As eleições eram disputadas nos clubes por meio de voto dos
rapazes. Zelita Rodrigues foi a primeira, em 1955.
As disputas eram organizadas pelos
presidentes das agremiações para arrecadar dinheiro. E as candidatas não
sabiam que estavam sendo votadas. Eram sempre três ou quatro
concorrentes e, ao contrário de hoje, eram lançadas pelos rapazes.
Assaltos carnavalescos
Não, os brincantes não aproveitavam o
momento para assaltar comércios e residências. Mas, embalados ao som de
orquestras, tomavam as vias públicas e invadiam as casas dos presidentes
de clubes ou outros membros da alta sociedade para festejar.
Quando as marchinhas tocavam em frente
ao portão, não adiantava mais fazer nada. Restava ao proprietário abrir
a casa, afastar as cadeiras e providenciar os comes e bebes. Os
assaltos começavam em janeiro, logo após as festas de fim de ano.
Todos os sábados havia um arrastão. A
orquestra ia sempre à frente e os grupos entravam afastando os móveis,
por volta das 20h, e só saiam à 1h da madrugada. Essas e outras
histórias fizeram parte dos carnavais de Rio Branco. Hoje, as festas
passaram por mudanças, mas não perderam o mais importante: o espírito
comunitário e a vontade de viver e ser feliz, seja na rua ou na avenida.
André Lima (Assessoria FGB)
Colaborou: Agência de Notícias do Acre
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