O patrimônio cultural de Paraty é tema da mesa Zé Kleber


O defeso, termo para o período de proibição da pesca de espécies ameaçadas, foi apropriado e ressignificado pelo artista paratiense Luís Perequê: passou a se associar à valorização das manifestações culturais tradicionais, de modo que elas não se percam nas demandas do turismo culturalmente predatório. O Defeso Cultural foi tema da mesa Zé Kleber, intitulada Culturais locais e globais, que reuniu na tarde desta quinta-feira o cantor, compositor e ex-ministro da Cultura Gilberto Gil e a historiadora Marina de Mello e Souza, autora de Paraty, a cidade e as festas (Ouro sobre Azul, 2008), entre outros títulos, e coordenadora do Núcleo de Apoio à Pesquisa Brasil-África da Universidade de São Paulo, onde leciona.


Evento especial na Festa Literária Internacional de Paraty desde 2005, a mesa Zé Kleber é assim batizada em homenagem ao poeta, músico e ativista paratiense, e traz para o debate a cidade e suas políticas públicas. Na discussão de hoje, não faltaram referências à história de Paraty – no breve mas preciso panorama que Marina traçou da cidade no último século –, ao multiculturalismo policêntrico – que propõe a negação dos conceitos de centro e periferia e a afirmação da ideia de diferentes centros em suas regiões –, às disputas de territórios – com a presença de integrantes do Fórum de Comunidades Tradicionais de Paraty e do Movimento de Defesa dos Sem Territórios, com faixas levantadas no fundo da tenda –, e, naturalmente, às manifestações que tomaram as ruas do país no último mês.


Depois de um vídeo em que Perequê apresentava o Defeso Cultural, Marina fez uma fala “mais estruturante, de professora”, recuperando as influências e afluências que Paraty recebeu ao longo do século, até que, nas últimas décadas, os paritienses começassem um processo de valorização das tradições locais. Gil, por sua vez, iniciou sua fala retomando um sonho de progresso que Marina havia identificado no começo do século 20 em um jornal da cidade; o baiano recitou sua canção Futurível, escrita a partir de um sonho que teve quando esteve preso, no final dos anos 1960, sobre uma transmutação do homem. “Essa canção também pode ser traduzida como um pesadelo, pela descaracterização absoluta da humanidade”, comentou.


Elogiado por sua atuação como ministro da Cultura, entre 2003 e 2008, pela historiadora e pelo mediador da mesa, Alexandre Pimentel, diretor da Biblioteca Parque de Manguinhos, Gilberto Gil foi bastante aplaudido ao fazer colocações sobre preservação do patrimônio – quando contou uma anedota sobre um amigo empreendedor que se recusou a ajudar na instalação de um resort – e ao proferir que “o Estado deixou de representar o interesse publico e passou a representar o interesse privado”.

Também foi aclamado ao concluir que “A luta continua”, em referências às brigas por territórios, desde antes da chegada dos portugueses, entre os índios; nesse aspecto, Marina recuperou o tema da espoliação dos indígenas e mencionou as populações africanas do passado, que pesquisa: “Para eles, a terra é dos deuses, dos espíritos, e é usada conforme a necessidade”. A historiadora lembrou em diversos momentos o papel do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), fundado por Mário de Andrade, para a preservação do patrimônio material e imaterial.


Os últimos minutos da conversa dedicaram-se às recentes manifestações populares do país, que Gil qualificou de raves e arrastões: “Vamos para a rua fazer política, mas vamos com as nossas formas culturais cultivadas hoje. Os arrastões são outra forma importante de manifestação cultural, dos menos favorecidos, dos mais marcados pelo ferrão da história”.

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