Greve dos professores no Uruguai: reflexões para o Brasil
Elaine C. S dos Santos e Jimena Lemes
As promessas do governo da Frente
Ampla (coalizão partidária do atual presidente uruguaio José Mujica)
para o aumento do investimento na Educação Pública não se consolidaram.
Há uma escassez estrutural para desenvolver o processo de
ensino-aprendizagem necessário. A dinâmica estatal tem sido transformar
em espaços de contenção os centros de estudos, enfatizando o treinamento
e a formação de trabalhadores acríticos em detrimento ao
desenvolvimento integral humano.
Frente a uma nova proposta de
orçamento anual que será votada em 90 dias, os professores uruguaios
iniciaram uma greve no dia 20 de junho reivindicando: salario digno,
melhoria estrutural do espaço escolar, número limite de discentes por
turma, número de horas limite de trabalho docente e um salario inicial
por meia bolsa familiar no valor de $U 25000 (o salário atual é de $U
14000). Desta forma, o movimento foi crescendo desde a base, uniram-se à
luta, os professores do interior do país, os funcionários e também
setores da Universidade. Em contrapartida, o governo tem se mostrado
totalmente insensível às reclamações dos profissionais da educação que
contam também com o apoio da população.
Nesta conjuntura, o Uruguai vive uma
iniciativa popular sobre uma reforma constitucional objetivando igualar
o salário de um parlamentar ao salário de um docente. Para alcançar
esta reforma na Constituição é necessário coletar assinaturas e seguir
um processo burocrático que se definirá nos próximos dias em uma reunião
com a Corte Eleitoral.
Por que esta iniciativa? A
desigualdade salarial no Uruguai atingiu níveis inimagináveis. O país
está em 10° na América Latina no que tange aos investimentos em educação
com base no PIB, mas está em 2° sobre o custo do seu Parlamento. A
propositiva é tornar os salários dos profissionais da educação
correspondentes a de um parlamentar, eliminando os adicionais
incorporados aos salários dos parlamentares. Hoje, o salário de um
senador é de $148.000 contra um salário de $ 14.305 para um professor do
ensino médio com 20 horas. A média salarial, aprovada a reforma,
ficaria em torno de $ 81.153. Um legislador não morreria de fome e
teríamos um professor com salário digno com possibilidades de ministrar
aulas em uma única escola, sem acúmulos de cargos (público e privado)
como ocorre atualmente. Um feito inédito na história uruguaia, a partir
de uma pauta legitima e embasada no real, considerando que o salario de
um docente é miserável fato que o obriga a ter uma carga horária
excessiva semanalmente. Com um salario digno certamente teríamos uma
educação de melhor qualidade.
Os professores decidiram suspender a
greve para realizar as provas finais, mas, no dia 15 de julho voltaram
às ruas e devem se reunir em assembleia, para decidir os rumos do
conflito. Cedo ou tarde, o objetivo é dissolver a política econômica e
educacional do governo, atendendo as justas reivindicações de todos os
trabalhadores.
É importante ressaltar que
atualmente a América Latina vivencia um momento característico, em que a
luta nas ruas tem se mostrado mais intensa e forte. Por outro lado
sabemos que a grande mídia, ao ignorar e depreciar a luta dos
trabalhadores dificulta a união de forças contrárias à opressão dentro
do capitalismo. Sendo assim, é fundante a união das forças
internacionais contra a austeridade e as tomadas de decisão, ponderando
que em diversos países latinos ocorrem simultaneamente processos
combativos às formas de abuso que o capital coloca diariamente. É hora
de conhecer e gerar um tecido entre as realidades de nossos companheiros
que estão em lutas comuns, no dia a dia enfrentando as mesmas
problemáticas sem ser ouvidos.
Avante os que Lutam!
*Elaine C. S dos Santos é socióloga,
Mestre em Energia pela Universidade Federal do ABC e professora de
sociologia na rede pública do Estado de São Paulo.
*Jimena Lemes é matemática,
Mestranda em Ensino, História e Filosofia das Ciências e Matemática pela
Universidade Federal do ABC e professora da rede pública de Montevidéu –
Uruguai.
Fonte: Artigo publicado originalmente no jornal Brasil de Fato
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