Pedido de vista suspende julgamento sobre expulsão de estrangeiro com filho nascido no país

Pedido de vista formulado pelo ministro Gilmar Mendes, nesta quinta-feira (22), suspendeu o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), do Recurso Extraordinário (RE) 608898, com repercussão geral reconhecida, no qual se discute a proibição de expulsão de estrangeiro com filhos no Brasil. Até o momento, o relator do recurso, ministro Marco Aurélio, e mais seis ministros votaram pelo desprovimento do recurso interposto pela União e ressaltaram a preponderância dos princípios da proteção do interesse da criança e da família presentes na Constituição Federal de 1988.
No RE, a União questiona decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, ao julgar habeas corpus, proibiu a expulsão de estrangeiro com filho brasileiro nascido posteriormente ao fato motivador do ato expulsório. De acordo com aquela corte, a concepção de filho brasileiro após o fato que originou a expulsão impede a medida, tendo em vista os princípios da proteção do interesse da criança e da garantia do direito à identidade, à convivência familiar e à assistência pelos pais, presentes na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Segundo alega a União, a Lei 6.815/1980 (Estatuto do Estrangeiro) – matéria atualmente regida pela Lei 13.445/2017 (Lei de Migração) – previu a impossibilidade de expulsão de estrangeiro somente quando a prole brasileira seja anterior ao fato motivador da expulsão.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou pelo desprovimento do recurso sob o argumento de que a exceção prevista no artigo 75 da Lei 6.815/1980 deve ser mitigada para proteger o núcleo familiar e, em especial, o interesse afetivo e econômico da criança. Também a Defensoria Pública da União (DPU), admitida como interessada no processo, requereu o desprovimento do recurso com os mesmos fundamentos.
Relator
Para o relator do recurso, ministro Marco Aurélio, considerada a especial proteção constitucional à família e à criança, o parágrafo 1º do artigo 75 da Lei 6.815/1980 não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. O ministro lembrou que o Supremo, em situações referentes à expulsão de estrangeiro, já assentou que o âmbito de discricionariedade do presidente da República é limitado pela Lei 6.815/1980, e cumpre ao Tribunal apreciar a legalidade e a constitucionalidade do procedimento adotado pelo Executivo. Além disso, as questões sobre os requisitos para expulsão de estrangeiro foram reiteradamente examinadas pelo STF, mas apenas com base na interpretação isolada do dispositivo do Estatuto do Estrangeiro. O Tribunal tem afirmado, nesses casos, a impossibilidade de opor à expulsão a existência de filhos nascidos após o fato criminoso, disse o relator.
No caso concreto, explicou o ministro, discute-se o tema sob ângulo constitucional e, nesse caso, defendeu que o fundamento de soberania trazido pela Lei 6.815/1980 deve ser compatibilizado com os avanços constitucionais. Segundo ele, a Carta de 1988 intensificou a tutela da família e da criança, assegurando-lhes cuidado especial, que foi concretizado pelo legislador na edição do ECA. “É impróprio articular com a noção de interesse nacional inerente à expulsão de estrangeiro quando essa atuação estatal alcança a situação da criança, sob os ângulos econômico e psicossocial”. afirmou
A regra do parágrafo 1º do artigo 75 da Lei 6.815/1980, para o relator, representa a quebra da relação familiar, independentemente da situação econômica do menor e dos vínculos socioafetivos desenvolvidos. “Priva-se perpetuamente a criança do convívio familiar, da conformação da identidade. Dificulta-se o acesso aos meios necessários à subsistência, presentes os obstáculos decorrentes da cobrança de pensão alimentícia de indivíduo domiciliado ou residente em outro país. É dizer, impõe-se à criança ruptura e desamparo, cujos efeitos repercutem nos mais diversos planos da existência, em colisão não apenas com a proteção especial conferida à criança, mas também com o âmago do princípio da proteção à dignidade da pessoa humana”, destacou o ministro.
Além disso, afirmou que a norma questionada afronta o princípio da isonomia ao estabelecer tratamento discriminatório entre filhos havidos antes e após o fato motivador da expulsão. Os prejuízos associados à expulsão de genitor, defendeu o ministro, independem da data do nascimento ou da adoção, muito menos do marco aleatório representado pela prática da conduta motivadora da expulsão.
Por fim, destacou que a prevalência dos princípios da proteção do interesse da criança e da família “não esvazia a soberania nacional”, uma vez que o estrangeiro continuará obrigado a comprovar ter filho
brasileiro sob a própria guarda e dependente economicamente, conforme previsto no artigo 75, inciso II, alínea “b”, da Lei 6.815/1980. "Exige-se do estrangeiro a demonstração de vínculo qualificado com o País, apto a, dentro das balizas legais, autorizar a permanência em território nacional", explicou. 
Acompanharam o voto do relator os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski.

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