Senador foi crucial para entrada do Brasil na 1ª Guerra

Ricardo Westin

Em maio de 1917, Nilo Peçanha, Ruy Barbosa, Wenceslau Braz, Rodrigues Alves e Urbano Santos

Documentos guardados no Arquivo do Senado lançam luzes sobre um episódio esquecido da história: a participação do Brasil na 1ª Guerra Mundial, conflito iniciado há 100 anos, em 1914. Os documentos mostram que as opiniões de Ruy Barbosa (1849–1923), senador na época, foram cruciais para que o Brasil decidisse declarar guerra contra os impérios centrais e enviar homens e navios para a Europa.
— Tenho sido acusado de estar pregando a guerra no continente americano em paz — discursa Ruy Barbosa (PRL-BA) em maio de 1917, no Palácio do Conde dos Arcos, a sede do Senado, no Rio. — Não, senhores senadores, não preguei até hoje a guerra. A guerra não é matéria de arbítrio, deliberação ou escolha, mas uma situação criada pela Alemanha, que, envolvendo todos os países neutros na mesma situação dos beligerantes na guerra naval, não deixa aos neutros outro caminho senão o de aceitar a guerra que ela declara.
A Alemanha era um dos impérios centrais, ao lado do Império Austro-Húngaro e do Império Turco-Otomano. Esse grupo estava em guerra com os chamados países aliados — Reino Unido, França, Rússia e, mais tarde, Estados Unidos. Quando a guerra é deflagrada, o Brasil opta pela neutralidade. A situação muda depois que submarinos alemães torpedeiam navios comerciais brasileiros. Inconformado, Ruy Barbosa insiste que o país não pode tolerar a ofensiva do “enxame de submarinos” e tem de entrar na guerra:
— A Alemanha arroga a si o direito estupendo, inominável e infernal de matar indistintamente, como carga nos navios que destroem, os seus capitães, os seus tripulantes e os seus passageiros. É ilógico, é absurdo sustentar a neutralidade brasileira. Quando uma nação chega ao extremo, à miséria de não ter meios de se defender, de ser obrigada a tolerar em silêncio absoluto e resignação ilimitada todos os atos contra o seu direito, a sua honra e a sua existência, essa nação perdeu o direito de existir.
A gota d’água é o torpedeamento do navio Macau, em outubro de 1917, na costa espanhola. Antes de a embarcação ir a pique, dois tripulantes foram capturados como prisioneiros de guerra. Dias depois, o governo finalmente declara guerra.
Ruy Barbosa tem papel decisivo. Por um lado, é um dos mais influentes conselheiros do presidente Wenceslau Braz. Antes de tomar a resolução, o mandatário se reúne com o senador. Por outro lado, Ruy Barbosa combina seus conhecimentos de direito internacional com seu poder retórico para convencer os colegas do Senado a aprovar no mesmo dia a declaração de guerra proposta pelo presidente.
— Não obstante a nossa relativa pequenez, a nossa notória ausência de recursos [...],[ao aprovar o estado de guerra] daremos o passo mais grave, mais extraordinário dos anais do Parlamento brasileiro. O mundo nos começará a olhar como nação capaz de virtudes e heroísmos.
Ruy Barbosa é uma das figuras brasileiras mais admiradas de todos os tempos. Além de senador, foi advogado, jurista, jornalista, diplomata, ministro, deputado, ensaísta e até presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL). Foi ministro da Fazenda logo no primeiro governo da República. A passagem pelo Senado foi longeva, de 1890 a 1921. Candidatou-se quatro vezes à Presidência da República, sem sucesso. Representou o Brasil na Conferência de Paz de Haia, em 1907, onde ganhou respeito internacional por brigar pelos países fracos contra os interesses das potências. Foi então que ganhou a alcunha de Águia de Haia.
No Brasil, os partidários dos aliados normalmente utilizavam argumentos ideológicos ou econômicos — o Reino Unido era um grande parceiro comercial e mantinha muitos investimentos no país. Diferentemente deles, Ruy Barbosa escolhe seu lado na guerra baseado em questões jurídicas. Explica Christiane Laidler, professora de história da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj):
— Para ele, a Alemanha violava as regras do direito internacional. Ele apontava os crimes de guerra e o desrespeito à neutralidade dos países, como a invasão de Luxemburgo e da Bélgica. A Alemanha representava uma ameaça à segurança de todas as nações, sobretudo as pequenas, que dependiam do direito para se protegerem dos países que usavam a força.
A 1ª Guerra terminaria um ano depois, em 1918, com um saldo de 16 milhões de mortos. O Brasil figuraria entre os vitoriosos.
Agência Senado

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