Para debatedores, pesquisa sobre estupro mostra que sociedade reproduz ideal machista

Iara Guimarães Altafin
A recente pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sobre o estupro mostra que a sociedade brasileira reproduz ideal machista que torna a mulher objeto de desejo e de propriedade, permitindo que a vítima de violência seja responsabilizada pela agressão, por sua forma de se vestir ou de se portar.
A conclusão foi comum aos participantes de debate conjunto promovido nesta terça-feira (15) pelas Comissões de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) e de Assuntos Sociais (CAS), que analisou os resultados da pesquisa, divulgada no fim de março.
– Há uma inversão de papeis entre vítimas e culpados. A culpa passa a ser da vítima e não do algoz – disse Daniel Cerqueira, representante do Ipea no debate.
Conforme dados citados por ele, 58,5% dos entrevistados concordam com a ideia de que "se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros". Para o representante do Ipea, o erro cometido na divulgação da pesquisa não afetou o resultado geral. O instituto informou que 65% concordavam com a afirmação de que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas", mas depois corrigiu o percentual para 26%.
As conclusões do estudo, frisou Cerqueira, evidenciam que há tolerância com a violência sexual contra mulheres e revelam valores que a sociedade tenta “esconder debaixo do tapete”.
As senadoras Ana Rita (PT-ES) e Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), que sugeriram o debate, concordaram.
– Nós carregamos uma grande dose de machismo, não apenas os homens, mas também as mulheres. Todo ser humano é fruto do ambiente em que foi criado e, apesar da legislação criminalizar a discriminação, as práticas sociais precisam ser modificadas para garantir igualdade entre homens e mulheres – disse Vanessa Grazziottin.
Na avaliação de Andrei Soares, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a pesquisa mostra que o estupro não é percebido como violência sexual, mas como desculpa sexual para se praticar a violência.
Educação
Para a jornalista Nana Queiroz, que criou a campanha "Eu não mereço ser estuprada", a mudança deve começar nas escolas, desde as séries iniciais. Conforme sugeriu, as crianças devem ser orientadas para que possam identificar o que é abuso sexual.
– Muitas crianças e adolescentes que sofrem abuso não têm ideia que estão sofrendo abuso e que têm o direito de denunciar. Os professores precisam estar preparados para discutir estupro com as crianças. Não é preciso criar uma cultura de pânico, mas é preciso falar de estupro desde a pré-escola, em linguagem adequada – disse.
Nana Queiroz informou que 85% dos casos de estupro no Distrito Federal acontecem dentro de casa. Para ela, a solução não está “no endurecimento das leis”, mas no trabalho em diversas frentes para fazer com que 100% das vítimas denunciem seus agressores.
Ao concordar, Ana Rita destacou a importância de iniciativas para mudar a percepção da sociedade sobre o problema e de ações firmes dos governos federal, estaduais e municipais.
– Precisamos fazer um trabalho preventivo e adotar políticas públicas eficientes, que sejam de fato implementadas pelo poder público, pois são vidas comprometidas ainda na infância, devido aos abusos – disse a senadora.
Para Beatriz Cruz, do Ministério da Justiça, o desafio do país é “desconstruir” a cultura de violência contra a mulher, que se mantém na sociedade.
– Isso é algo difícil de fazer, pois temos no Brasil a falsa percepção de que não somos um país violento, que nosso país não é machista, não é racista. Nós brasileiros não nos enxergamos nessa cultura – disse.
Pedofilia
Também o senador Waldemir Moka (PMDB-MS) se disse “horrorizado” com os resultados revelados pela pesquisa e lembrou que o tema ganhou nova dimensão com o pedido de perdão do Papa Francisco às vítimas de padres pedófilos.
– Mas não basta o pedido de perdão, também é preciso punir os padres pedófilos – opinou o senador.
Ao se referir ao erro na pesquisa do Ipea, Waldemir Moka disse considerar que o problema deixou “um ruído” na sociedade, dificultando uma discussão maior dos dados. Ele sugeriu que o instituto realize novo estudo, quando considerar adequado.
Agência Senado

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