Para Ruy Castro, biografado bom é biografado morto



Biógrafo de mortos, “porque os vivos são pouco confiáveis”, Ruy Castro levou hoje à tarde sua prosa bem humorada e inteligente à Casa da Cultura de Paraty. Parte da programação da FlipMais, o encontro teve como anfitrião o jornalista Paulo Werneck.


Autor de obras sobre a vida de grandes personagens brasileiros, como o dramaturgo Nelson Rodrigues (O anjo pornográfico) e o jogador de futebol Garrincha (Estrela solitária), Ruy falou sobre as “regras” para escrever uma boa biografia. À personagem não basta ter morrido. Convém esperar passar uns oito anos. “E o biógrafo não pode deixar que suas emoções e convicções interfiram no trabalho. Ele não pode aparecer, não tem direito de imaginar nem intuir nada. Está ali para recolher informações e conversar várias vezes com o mesmo entrevistado”, disse o autor do recém-lançado Morrer de prazer, crônicas da vida por um fio. “O biógrafo deixa de existir como pessoa. Ele se muda para a vida do biografado, e a busca pelos mínimos detalhes se torna uma coisa doentia.”


Quando estava pesquisando para escrever o livro sobre Nelson Rodrigues, Ruy não sossegou enquanto não conseguiu descobrir um detalhe que, a outros olhos, pareceria insignificante: a marca da escarredeira do jornal do pai do dramaturgo. “Quando você descobre é um prazer quase erótico, sexual. Só comeco a escrever quando tenho todos os detalhes.”


Fã assumido de empadinhas, o autor falou também de sua vida pessoal e leu à plateia uma coluna publicada na Folha de S.Paulo, onde ele assina quatro textos semanalmente. Abstêmio há 25 anos, Ruy conta nessa crônica que, na fase mais crítica de seu alcoolismo, bebia no mínimo dois litros de vodca por dia.


Cinco anos depois de ter parado de beber, o escritor teve a ideia de fazer um livro sobre um alcoólatra. Achou que sua experiência no assunto o ajudaria a fazer as perguntas certas. “Imediatamente me veio à cabeça o Garrincha. Eu não queria contar a história de um derrotado. Queria contar a história de um vencedor”, disse. “Não era por falta de amor que o Garrincha bebia. Ele foi amado desesperadamente pela Elza [Soares] e pelos brasileiros. Foi um vencedor destroçado pela bebida.”


Outro momento em que a vida pessoal de Ruy Castro foi abordada na conversa de hoje teve relação com a produção de um de seus livros. Quando sentou para escrever a biografia da cantora Carmen Miranda, sentiu uma irritação na garganta e descobriu um tumor. Terminou a obra entre sessões de químio e radioterapia. “A Carmem Miranda me ajudou a escrever. Eu não pensava na dor, em nada, pensava só nela. É claro que os médicos foram importantíssimos, mas se não fosse a Carmen...”


Ruy, que ainda hoje escreve suas colunas num pequeno bloco de notas, foi questionado sobre redes sociais e arrancou risadas. “Mal tenho tempo de mandar um telegrama para minha mãe, de dar um telefonema. Querem conversar, conversem. Eu não tenho tempo para isso.”


Divertiu a plateia também ao falar sobre o novo Maracanã e a cobertura construída no estádio. “Agora torcedor não pode mais tomar chuva. Futebol não é ópera. Não tem batucada, não tem charanga. O torcedor virou um inglês, um suíço.”

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