OPINIÃO | Pelo fortalecimento dos partidos políticos
Artigo do presidente da liga do desporto, Jean Gaspar, sobre reforma política e o fortalecimento dos partidos
Jean Gaspar
Além da Copa do Mundo, o próximo ano será marcado por
eleições nacionais para presidente, governadores, senadores, deputados federais
e estaduais. O momento atual é, portanto, mais do que oportuno para retomarmos
a discussão sobre a reforma política, tema que tem sido colocado em segundo plano
pelo Governo, Congresso e partidos.
Esse não é um assunto simples e exige que as lideranças
políticas se disponham a reconhecer que está em jogo, não a preservação de
posições dominantes ou a sobrevivência das estruturas de poder existentes, mas
o aperfeiçoamento da democracia, inseparável do esforço que o Brasil vem
fazendo para modernizar sua economia e colocar-se dentre as maiores nações do
mundo.
O primeiro passo é a mudança de mentalidade, em busca de uma
renovação de conceitos e da valorização da ética na política, que não pode ser
mera figura de retórica, mas sim o objetivo real.
Os recentes protestos populares indicam que o brasileiro não
quer a manutenção da política atual, em termos de corrupção, desonestidade,
nepotismo e clientelismo. Para mudar esse cenário, temos de fortalecer nossa
democracia. A experiência histórica mostra que não há democracias fortes sem
partidos também fortes, que expressem, em seu ideário e em suas ações
políticas, as opiniões e os anseios dos diferentes setores da sociedade.
Os partidos são a base da
organização política. Precisam ter personalidade própria, claras e
transparentes quanto ao seu posicionamento ideológico. Precisam ocupar, na
composição de forças que moldam os regimes e os governos, posições nitidamente
identificáveis e, fundamentalmente, coerentes com seus programas.
O quadro partidário hoje é marcado pela proliferação de pequenas agremiações, criadas em geral para viabilizar projetos individuais ou de grupos, mas sem compromisso com a sociedade
É assim que ocorre em outros
países, como vemos nos Estados Unidos com os democratas e os republicanos ou
ainda na França com a direita (UMP do ex-presidente Sarkozy), a extrema direita
(FN da Marine Lepen), ou ainda a esquerda com o PS do atual presidente François
Hollande. O partido reflete as diferentes correntes ideológicas da sociedade,
favorecendo a identificação do eleitor. Aqui, entretanto, temos uma
multiplicidade de partidos que não se alinham a nada, a não ser aos próprios
interesses personalistas de seus membros.
O quadro partidário hoje é
marcado pela proliferação de pequenas agremiações, criadas em geral para
viabilizar projetos individuais ou de grupos, mas sem compromisso com a
sociedade. Muitos desses partidos cumprem uma tarefa politicamente abominável:
“vendem” seu tempo de televisão e rádio, já que cada partido, independentemente
de sua representatividade, conta com um tempo mínimo. Por isso, vemos alianças
aparentemente paradoxais sendo feitas entre partidos políticos – antes das
eleições – para garantir maior espaço no rádio e na televisão. Afinal, tempo no
HGPE (Horário Gratuito da Propaganda Eleitoral) é poder, tendo em vista a
importância do rádio e da televisão na formação da opinião pública, pois é fonte
de informação política e de persuasão.
Não é por acaso que vários
partidos merecem o nome espúrio de “legenda de aluguel”. Qualquer proposta
séria de reforma política tem de ter como prioridade a exigência de uma base
eleitoral representativa, para inviabilizar a sobrevivência dessas organizações
oportunistas. Os “donos” dessas legendas de aluguel não podem a seu bel prazer
fazer uso do HGPE para benefício próprio, desvirtuando nossa democracia. A
legislação sobre o uso dos meios de comunicação em campanha eleitoral precisa
impedir tais anomalias.
Outro fator que desgasta nossa
democracia e enfraquece a organização partidária é a liberalidade com que
aventureiros trocam de partidos. A fidelidade partidária é indispensável para
dar consistência e credibilidade às agremiações. Como profissional da área esportiva,
recorro à metáfora do jogador de futebol que troca de camisa do time ao término
de seu contrato. Na política, é diferente. O político lida com valores éticos e
suas decisões afetam a vida das pessoas e do país. Não é concebível, portanto,
que troque de lado ao sabor de interesses pessoais. É fundamental que se
estabeleçam prazos claros e bem determinados para mudança de filiação.
Há ainda vários outros aspectos, que
abordaremos futuramente. Neste momento, o que é mais importante é a mobilização
da sociedade para os temas em pauta. Já podemos computar como um avanço
democrático a reprovação da PEC 37 (Proposta de Emenda Constitucional no. 37),
que tirava o poder do Ministério Público para investigar crimes. Foi uma
vitória popular. É esse o caminho que devemos seguir rumo às mudanças políticas
que o país não pode mais esperar.
Jean Gaspar, mestre em Filosofia pela PUC/SP, é apresentador do programa Filosofia no Cotidiano (TV Cantareira) e presidente da Liga do Desporto, entidade que promove atividades físicas e desportivas como instrumento de educação e formação da cidadania.
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