Jovens poetas maduras em busca da poesia
Festas de Paraty | |||||||
Tiradas líricas e definições poéticas embalaram a primeira
mesa desta quinta-feira, O dia a dia debaixo d’água, com as (justamente)
poetas Alice Sant’Anna, Ana Martins Marques e Bruna Beber. “Os poemas
de amor estão nas maçanetas, disfarçados”, comentou Alice, que
recentemente lançou Rabo de baleia. “A poesia na minha vida é uma
varanda: esse espaço em que você pode dormir, chorar, ver o cachorro
correr, olhar as flores, respirar”, pontuou Bruna, que publicou Rua da padaria,
entre outros livros. “Dá para pensar no mar como uma metáfora da
criação poética. O poema é aquilo que vem à tona, dá forma aquele
informe que está submerso. O poema é uma espécie de iceberg”, definiu
Ana, autora de A vida submarina e Da arte das armadilhas, em sua primeira resposta à escritora, professora e crítica Noemi Jaffe, mediadora do encontro. A pergunta que deu início ao debate nasceu do próprio título da mesa, que trazia o mar nas entrelinhas, ligado à chamada “poesia do cotidiano” das autoras. A crítica o associou à possibilidade de fuga de um desencanto com a linguagem, que ela identifica na obra das três. Mar e linguagem estão como que associados, sugeriu Ana, ao citar um verso do poeta português Vergílio Ferreira: “Da minha língua vê-se o mar”. A conversa vagou tanto pelos temas quanto pelo próprio ofício e a (não) função da poesia. Noemi ressaltou sua surpresa em relação à maturidade precoce das autoras – que, embora ainda bastante jovens, em torno dos 30 anos, apresentam uma consciência bastante aguda da passagem do tempo, segundo ela. A partir de trechos que leu ou palavras que havia pescado da obra das poetas, ela as questionou sobre a presença do amor em seus livros – que, afinal, pertencem ao gênero lírico, associado tradicionalmente ao amor – e sobre a decisão de onde cortar o verso. Ao explicar suas escolhas em relação ao verso livre, cada uma delas acabou por revelar mais de sua poesia. Bruna, por exemplo, disse estar sempre em busca da oralidade, e para isso chega a gravar e até cantar seus próprios poemas. “O ouvido é muito importante no meio caso. Escrevo como se estivesse acompanhando minha fala e meu pensamento, e às vezes é como se o poema fosse foiçado, de tão seco e brusco”, disse. Já Ana está mais ligada à materialidade das palavras: preocupa-se com sua disposição na página impressa, ainda que sua produção não esteja associada à poesia visual. “Acho que os cortes são feitos também seguindo um ritmo gráfico.” Alice, por sua vez, expôs estar em busca de possíveis ambiguidades no verso: “É possível ler com diferentes sentidos, dependendo de onde se faz a pontuação”. O entrosamento das três autoras entre si e com a mediadora revelou-se nas respostas que viraram informais réplicas e tréplicas a respeito da obra própria e da alheia, de forma que as poetas muitas vezes destacaram aspectos comuns às três, como uma chave de ironia em que navegam e uma “ternura pelos próprios erros”, definição de Noemi para espécies de tropeços que acabam tematizados nos poemas. “A gente tenta transformar o tropeço em passo de dança”, comparou Alice. “Minha ideia do poeta é uma pessoa que em algum sentido é desengonçada. Quando a gente consegue controlar o tropeço, faz quase uma coreografia”, disse. Sem que fosse preciso recorrer a tais malabarismos, as leituras que cada uma fez de alguns poemas não tinham a seriedade e nervosismo que marcam alguns desses momentos, geralmente introdutórios das mesas de debate. |
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